Quer companhia melhor para as férias de janeiro do que Steven Seagal em sua fase gordão, fora de forma e 'direct-to-DVD'?
(Sim, isso foi uma ironia...)
Ironias à parte, joguei no lixo uma semana das minhas férias de janeiro assistindo um punhado de filmes baratos e sem maiores referências estrelados pelo ex-astro Steven Seagal. Alguns dirão que sou masoquista, mas ver filmes do Steven Seagal na praia me parece muito mais divertido que se lambuzar de bloqueador solar fator 40 e ficar melecado disso (mais areia e suor) à beira do gelado e sujo mar gaúcho...
Aproveitando a deixa, resolvi brindar meus nobres leitores (sim, a parte do 'brindar' também foi uma ironia) com uma autêntica MARATONA STEVEN SEAGAL: durante uma semana e um dia, teremos atualizações diárias do FILMES PARA DOIDOS com resenhas das produções bagaceiras e decadentes estreladas por Steven Seagal depois que ele deixou o cinemão 'classe A' (pós-'Rede de Corrupção') para fazer qualquer porcaria que surgisse na frente.
Acompanhem o cronograma das atualizações:
DETERMINADO A MATAR (Out for a Kill, 2003)
RESGATE SEM LIMITES (Belly of the Beast, 2003)
OPERAÇÃO SOL NASCENTE (Into the Sun, 2005)
LADO A LADO COM O INIMIGO (Submerged, 2005)
HOJE VOCÊ MORRE (Today You Die, 2005)
MERCENÁRIO (Mercenary for Justice, 2006)
JUSTIÇA URBANA (Urban Justice, 2007)
O JOGADOR (Pistol Whipped, 2008)
E quem tem um mínimo de intimidade com a carreira de Seagal 'pós-mainstream' sabe que ele só fez produções baratas, bagaceiras e, na maioria dos casos, ruins de doer. Sem a menor vergonha na cara, o velho 'quebra-braço' vem estrelando de três a quatro filmes por ano, sem se preocupar em esconder a falta de vontade de estar participando de alguns deles.
É o caso desse DETERMINADO A MATAR, sua segunda obra produzida direto para as videolocadoras, sem lançamento nos cinemas (a primeira foi 'O Estrangeiro', também de 2003), já dando mostras da decadência da carreira do 'ator'.
Agora, pense comigo: se já é difícil engolir o Steven Seagal gordão e fora de forma como policial, soldado ou mercenário (os três papéis que ele geralmente 'interpreta'), imagine acreditar que o cara possa personificar um respeitado arqueólogo (!?!) e professor de cultura chinesa (!?!).
Pois é isso mesmo: em DETERMINADO A MATAR, Seagal tem seus cinco minutos de Indiana Jones antes de sair distribuindo porrada em tudo e todos. Ainda bem que são só cinco minutos, porque a idéia de ver Steven Seagal procurando relíquias, visitando templos antigos e desfilando seu conhecimento da cultura chinesa não me animou em momento algum...
Ele interpreta Robert Burns, um premiado arqueólogo (cof, cof, cof) norte-americano que está fazendo escavações em antigas ruínas no leste da China. E imaginar Seagal manuseando antiguidades com sua costumeira 'delicadeza' já rende as primeiras gargalhadas involuntárias da película.
Para o azar do professor, bandidos ligados à máfia chinesa aproveitam as buscas arqueológicas para esconder drogas no interior das relíquias e poder contrabandeá-las facilmente através da fronteira.
Quando Burns descobre a falcatrua, os bandidos resolvem se livrar dele. Mas, durante uma perseguição de carros, matam apenas a assistente do professor, que, por sua vez, é absurdamente preso por todos os crimes - tanto pelo assassinato da assistente (embora o carro que ele dirija esteja crivado de balas PELO LADO DE FORA) quanto pelo contrabando de drogas (já que Burns assinou todos os documentos relacionados às peças com 'brindes' em seu interior, e para a polícia isso serve como prova).
Pelo menos o pobre arqueólogo não fica muito tempo na cadeia, já que dois agentes do DEA (o órgão norte-americano de combate às drogas) negociam sua libertação com o governo chinês,
A ideia é usá-lo como isca para chegar até os cabeças da organização criminosa. Só que os marginais cometem o erro fatal de matar a esposa de Burns (Kata Dobó, de 'Instinto Selvagem 2') num atentado a bomba.
Pronto: agora a 'isca' passará o restante do filme quebrando braços e pescoços!
DETERMINADO A MATAR é aquela velha e batida historinha de vingança já tantas vezes narrada pelo cinema. Os caras não conseguiram pensar nem mesmo num título menos genérico ou minimamente criativo.
Talvez conscientes disso, os produtores resolveram entregar o material a um diretor com olhar videoclipeiro, que 'enfeitou' a trama clichezenta para parecer mais moderninha e atrativa do que verdadeiramente é.
O tal diretor, Michael Oblowitz (que havia feito 'O Estrangeiro' com Seagal e depois dirigiu, hã, 'Sharkman'!!!), atira para todos os lados, mas raramente acerta algum alvo, ou convence o espectador.
Na maior parte do tempo, Oblowitz tenta emular Guy Ritchie, com seus cortes rápidos e vilões engraçadinhos.
A cena em que Seagal pega um voo de volta aos Estados Unidos, mostrada com cortes rápidos do passaporte sendo carimbado e do avião decolando, lembra MUITO as várias viagens do gângster interpretado por Dennis Farina em 'Snatch', que eram apresentadas e editadas da mesma forma.
Além disso, os 11 cabeças da máfia chinesa são sempre mostrados ao redor de uma mesa, fumando e rindo, enquanto legendas explicativas informam ao espectador nome, atividade criminosa e hobby (!!!) de cada um deles.
E, à medida que os sujeitos vão sendo mortos pelo herói, a mesa volta a aparecer em cena cada vez mais vazia, numa piadinha de humor negro que funcionaria num filme de Ritchie, mas soa deslocada aqui.
Outro toque 'Ritchieniano' é o fato de que todos os vilões combatidos por Seagal têm uma palavra diferente tatuada no pulso (!!!), e no final estas palavras formam um provérbio chinês (!!!), outro toque excêntrico/engraçadinho que talvez fizesse mais sentido num filme de Guy Ritchie ou Quentin Tarantino, mas aqui não serve para absolutamente nada.
Oblowitz às vezes também lembra um Michael Bay ou Zack Snyder dos pobres, abusando tanto daquele recurso de 'câmera acelerada que corta para câmera lenta' que torra a paciência do espectador - se isso já é chato na 'obra' de Bay ou Snyder, imagine num subproduto deles!
Aliás, tem tanto detalhe em câmera lenta no filme, inclusive uns bem gratuitos, que às vezes o uso do recurso parece até desculpa para esticar o tempo de duração do filme, que já é curto (oitenta e poucos minutos). Aposto que, se ele fosse editado em 'velocidade normal', ficaria com uns 45 minutos, se chegar a isso.
Mas a pior coisa de DETERMINADO A MATAR é Steven Seagal. O astro decadente não convence em momento algum, e às vezes até parece completamente perdido (ou sem vontade) no filme. Podiam inclusive mudar o título para 'Determinado a Matar Sua Carreira'.
O roteiro nunca se preocupa em explicar como é que um respeitado arqueólogo (cof, cof, cof) também é especialista em artes marciais, usa espada como se fosse ninja e atira com mira perfeita - embora, lá pelas tantas, alguém surja com informações sobre o passado do personagem como ladrão de relíquias e ex-agente da CIA!!!
Sem contar que o arqueólogo Robert Burns mais parece um fantasma, pois sempre aparece de repente quando os tais agentes do DEA que o estão seguindo (Corey Johnson e Michelle Goh) se metem em encrencas.
Tipo: bandidos sequestram os agentes? Ora, Burns estava passeando por ali naquele exato momento para salvá-los. Bandidos trocam tiros com os agentes? Pois Burns aparece literalmente do nada (!!!), e já com a arma em punho, para matar os bandidos. É tão forçado e absurdo que não tem como não rir: parece que, além de arqueólogo, Burns é um autêntico anjo da guarda dos caras!
Para piorar (ainda mais), o diretor usa várias ferramentas narrativas completamente desnecessárias, como a narração da história feita pela agente do DEA ou as inúmeras (e chatíssimas) legendas informando a hora e o lugar em que se passa determinada cena (já que o filme teoricamente acontece na China, nos EUA, na Bulgária e em Paris!).
Como já escrevi, isso tudo parece uma tentativa desesperada de dar certa sofisticação a um material batido e sem novidades. Não funciona, claro - mas eu confesso que gostei de uma cena em que a câmera 'acompanha' as balas disparadas pelos bandidos até elas chegarem no carro do herói, mesmo que o CGI da cena em questão seja de lascar...
Talvez o filme até funcionasse sem Steven Seagal no papel principal. Se fosse um ator desconhecido e minimamente carismático, quem sabe fosse mais fácil levar DETERMINADO A MATAR a sério.
Mas se já é difícil acreditar que Steven Seagal possa ser um arqueólogo especialista em matar de todas as formas possíveis, pior ainda é acreditar que um Steven Seagal gordão (sempre com casaco comprido e abotoado para esconder as banhas) possa fazer tanto estrago. E, como é de praxe, ele não muda de expressão facial uma única vez durante o filme todo!!!
Embora algumas lutas sejam bem filmadas, a edição caótica trata de estragar toda e cada cena de ação, sempre apelando para cortes rápidos e planos de detalhe, provavelmente para esconder o fato de que o astro está muito fora de forma. De tão exageradas e absurdas, as pancadarias acabam ficando até cômicas.
Eis uma amostra disso, e repare na ma-ra-vi-lho-sa continuidade que alterna cabelo solto, cabelo preso e o dublê de Seagal:
Assim, o resultado dessa aventura barata de Steven Seagal - a segunda de uma longa série de bombas - é um tanto constrangedor. Não convence, não empolga, e às vezes até tem certo valor como comédia involuntária (inegavelmente, é muito ENGRAÇADO ver a Baleia Seagal lutando!).
O que estraga são as irritantes tentativas de 'enfeitar' o filme com modernismos narrativos que não combinam em momento algum com o material apresentado. Ou será que alguém achou 'cool' ou 'artístico' ver o rosto de Seagal refletido no olho de um bandido antes de ele tomar uma porrada?
O resultado é um filme bem chulé, que até pode divertir numa tarde chuvosa ou noite de insônia, mas somente se suas expectativas estiverem EXTREMAMENTE baixas.
E ainda que seja melhor que muita porcaria estrelada por Seagal no seu período pançudo (tipo o execrável 'Operação Sol Nascente'), qualquer produção bagaceira com Gary Daniels, Joe Lara ou Jeff Wincott é muito melhor que essa bobagem levada a sério demais.
O ator bem que poderia aproveitar sua experiência como 'arqueólogo' para desenterrar sua carreira, já que hoje ela se encontra beeeem no fundo do poço...
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Determinado a Matar (Out For a Kill, 2003, EUA)
Direção: Michael Oblowitz
Elenco: Steven Seagal, Michelle Goh, Corey
Johnson, Tom Wu, Ozzie Yue, Bruce Wang,
Chike Chan e Hon Ping Tang."