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Frida Kahlo


Tina Modotti e Frida Kahlo, c. 1928



As fotografias saíram do armário da Casa Azul
(P2, Público, 04.11.2011)

Para se chegar a este tesouro, o imenso espólio pessoal de um dos casais pop do mundo da arte do século XX, Frida Kahlo e Diego Rivera, não foi preciso qualquer mapa. Sabia-se a localização exacta — há 50 anos que o “X” estava marcado em duas casas de banho da Casa Azul de Coyoacán, no México. Foi lá que, pouco antes de morrer, em Novembro de 1957, Rivera decidiu condenar à escuridão do tempo (em armários, caixotes e baús) boa parte dos pertences dos dois. O muralista pediu 15 anos de nojo, mas a amiga e fiel depositária das chaves do segredo, Dolores Olmedo, levou essa vontade ao extremo considerando que Rivera jamais quereria tornar pública a intimidade do casal.

E assim, pelo menos duas portas da Casa Azul, mais ligada a Frida do que a Diego, ficaram vedadas durante décadas a olhares estranhos. O tempo foi chamado ao seu labor inexorável, aguçando a curiosidade (a fotógrafa mexicana Graciela Iturbide realizou uma série de imagens na casa de banho de Frida em 2004), potenciando uma carga simbólica e mistério. Até à morte da guardiã das chaves. Em 2007, os novos responsáveis pelo Museu Frida Kahlo decidem que aquele é o momento para entrar nas divisões proibidas, tinha Frida nascido há 100 anos, tinha Diego morrido há 50. O lugar “X” da Casa Azul, o espaço onde porventura se escondiam os últimos pequenos nadas de Diego e Frida, o pouco de privado de uma vida muito pública, estava inventariado de forma geral pela mão do muralista. Mas o certo é que durante meio século poucos sabiam de que pérolas se formava este tesouro e qual era a sua verdadeira dimensão.

As arcas e os roupeiros foram abertos e o que se descobriu levou quase três anos a classificar: 22 mil documentos, 6500 fotografias, milhares de livros e revistas, dezenas de desenhos, objectos pessoais, roupa, medicamentos, jogos… Coisas de uma vida recheada. Uma vida intensa, bem plasmada nas imagens fotográficas recolhidas, às quais o historiador Pablo Ortiz Monasterio se dedicou para dar corpo a uma exposição que a Casa Azul/Museu Frida Kahlo mostrou no ano passado. Frida Kahlo – As suas fotografias, que reúne mais de 250 imagens, viaja pela primeira vez para fora do México para ser apresentada, hoje, na Casa da América Latina, em Lisboa. A exposição estará no Museu da Cidade, em Lisboa, até 29 de Janeiro.

O tesouro fotográfico que o casal foi juntando como um scrapbook (mais Frida do que Diego) absorveu todo o tipo de imagens. Aparecem banais registos familiares (o pai de Frida era fotógrafo), referências à luta política, o fascínio por Diego e a sua obra, o corpo estropiado e, claro, o folclore mexicano, tão querido à pintora que, apesar de uma grande proximidade com a prática fotográfica, não terá feito mais do que meia-dúzia de imagens. Do agitado círculo de amigos (e de amantes) faziam parte fotógrafos, por isso não é de estranhar que se tenham conservado imagens variadas de nomes entretanto consagrados como os de Tina Modotti, Edward Weston, Nickolas Muray, Martin Munkácsi, Manuel e Lola Álvarez Bravo, Gisèle Freund, entre outros.

É uma constelação que para o crítico e comissário espanhol Horacio Fernández, autor de um dos ensaios do catálogo, não chega para ultrapassar Frida Kahlo como principal referente de tudo o que é imagem na exposição. Mesmo sabendo que as fotografias não são da sua autoria (ao contrário do que o título da exposição pode sugerir), é a força aglutinadora da sua fi gura que vislumbramos, como um grande puzzle, no qual todas as fotografias que saíram agora do armário se encaixam para dar forma a mais um auto-retrato de Frida Kahlo.



Nickolas Muray, Frida Kahlo, Nova Iorque, 1946
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